quarta-feira, 18 de maio de 2011

A LÍNGUA PORTUGUESA


Presidente ou Presidenta? Polêmica, agora, é como o brasileiro vai chamar sua superpoderosa
Chamar presidenta fortalece a luta feminista porque sinaliza logo tratar-se de uma mulher?

Imagina uma cena assim.
- Presidente, presidente, como vai a senhora?
- Presidente uma conversa. Me respeite que eu sou é presidenta. Presidentaaa, entendeu bem? Presidenta!


Este suposto carão de Dilma é só um exercício de fantasia. Mas bem que poderia ilustrar a encruzilhada sociolinguística que sucedeu a eleição de Dilma Rousseff presidente do Brasil. Ou presidenta.

A questão pode parecer irrelevante, pois à primeira vista, tanto faz chamar de um ou de outro jeito. Mas ela traz em seu rastro inquietações decisivas para os próximos quatro anos. A escolha por uma ou outra opção gera resultados bem diferentes. Do ponto de vista da norma culta, os dicionários Aurélio e Houaiss já recomendam o uso de presidenta como feminino de presidente ou para a mulher do presidente, mas o debate não se esgota aí.

Chamar presidenta fortalece a luta feminista porque sinaliza logo tratar-se de uma mulher? Presidente, como o CORREIO prefere, é melhor que presidenta para os ouvidos e leitores sensíveis? Dá pra chegar a uma conclusão ou cada um faz sua escolha?

A professora Paula Gemima, especialista em linguagem de sinais para deficientes auditivos, optou por chamar presidente. “Assim, fazemos um sinal só com a mão, pois o sinal já traz implícita a ideia que é um homem presidente. Se chamar presidenta, seriam dois sinais, um para o cargo e outro para mulher”, simplificou, antes de treinar mais um aluno em Paripe, no Subúrbio, onde mantém seu curso.

COTIDIANO
Já a pedagoga e professora de português, Maria Cristina Vidal, prefere a opção mais fácil de entender. Estabelecida no ramo de suporte pedagógico, a antiga “banca” ou “reforço escolar”, ela ensina a seus alunos escreverem “a presidente” porque “a presidenta não soa bem”.

Cristina compara: “gerenta também existe, mas ninguém chama assim desse jeito. No Exército, não tem soldada, nem capitã... é muito feio!”.

A pró segue os ensinamentos do professor Adalberto J. Kaspary, que vai buscar na Academia das Ciências de Lisboa, a fonte para defender o uso da palavra comum a homem e mulher: presidente. Segundo a interpretação de Kaspary, “presidenta” pode tornar-se pejorativo, principalmente se ela fracassar.

Chamar de chefa e parenta também ficou meio baixo-astral em contextos específicos de desvalorização da mulher.

Ellen Gracie Northfleet, a primeira mulher a presidir o Supremo Tribunal Federal, se diz presidente, que é mais formal, como pede o cargo. A acadêmica Nélida Piñon seguiu esta trilha, ao apresentar-se como “a primeira presidente” da Academia Brasileira de Letras. Patrícia Amorim é a presidente do Flamengo e não presidenta.

O famoso professor Pasquale Cipro Neto se escala no time que prefere chamar “presidente Dilma”. Em uma de suas aparições em programas de TV sobre língua portuguesa, aproveitou o momento político para decretar: normalmente as palavras que terminam ‘nte’ não têm variação. “O que identifica o gênero é o artigo que o precede, como o gerente, a gerente, o pedinte, a pedinte”.

A professora baiana, filha de pais russos, Nadegda Kochergin, pede licença para discordar do mestre Pasquale: “Presidenta é melhor porque deixa claro ser uma mulher e a questão de gênero, agora para o Brasil, vai tomar um novo fôlego”. É assim, “presidenta Dilma” que o Kumon, estabelecimento onde a professora Nadegda trabalha, com 25 unidades em Salvador e Região Metropolitana, vai recomendar a seus 2,6 mil alunos.

Na campanha, o PT divulgou “candidata a presidenta”. Se for dado a Dilma o direito de decidir como prefere, é muito provável que ela determine ser chamada “presidenta”.

Antes, a forma feminina se estabeleceu em professora, doutora e juíza, que também soaram estranho nos primeiros anos, mas depois foram assimilados no falar cotidiano dos brasileiros.

MAIS SIMPLES
Na Argentina, a presidenta Cristina Kirchner jamais deixou qualquer dúvida de sua preferência. “Presidenta! Comecem a se acostumar. Presidentaaa... e não presidente!”, gritava aos eleitores e eleitoras, toda animada, na campanha.
As mulheres argentinas saíam do chão nos comícios, felizes da vida com a disposição de Cristina para encarar a tradição machista.

Artigo publicado no site correio24horas.com.br

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